Por Joaquim Haickel

Um amigo meu, um desses bem marotos, me ligou um pouco antes da sessão que seria realizada na Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal que sabatinaria Paulo Gonet e Flávio Dino para as vagas abertas na Procuradoria Geral da República e no Supremo Tribunal Federal, perguntando quais seriam as perguntas que eu faria para ambos caso fosse um dos senadores da CCJ.

Inicialmente disse a ele que não estava preparado para responder, assim de supetão uma questão desta, uma vez que não estudei os casos mais profunda e detalhadamente. Ele insistiu e disse que me conhecia o suficiente para saber que eu tenho uma boa performance no improviso e pediu então que eu improvisasse. Achei engraçado e resolvi ceder.

Disse a ele que as perguntas para o Gonet deveriam ser técnicas, uma vez que a função de procurador geral da república, que faz o papel de promotor de justiça, de advogado do povo, tem aspectos muito técnicos que precisam ser observados e respeitados.

Disse a ele que essa função de advogado do povo ou da sociedade é tão importante para o pleno e satisfatório funcionamento da democracia americana que em algumas cidades e em alguns estados daquele país, os ocupantes desses cargos são eleitos por voto direto da população, de maneira semelhante aos representantes do poder legislativo.

Para Gonet as perguntas seriam relativas ao devido processo legal. Ele deveria ser arguido sobre o funcionamento do poder judiciário e do processo judicial. Ele deveria responder, sem rodeios ou subterfúgios, se ele concorda com aquilo que prevê a Constituição Federal, que diz literalmente que cabe ao ministério público a iniciativa do processo judicial.

Ele deveria responder se na opinião dele é licito que um processo judicial seja aberto por iniciativa de algum juízo ou alguma corte de justiça, em qualquer uma de suas instâncias. Ele deveria dizer se em um mesmo processo, as funções de denunciante, investigador, acusador e juiz podem ser exercido pela mesma pessoa, e qual deve ser a posição do procurador geral da república em um caso onde isso esteja configurado.

Disse ao meu interlocutor que qualquer outra pergunta que fosse feita ao candidato a vaga da PGR seria desnecessária, pois em minha modesta opinião, seriam essas as respostas mais importantes.

No que dissesse respeito a Flávio Dino, eu faria a ele essas mesmas perguntas feitas a Gonet, mas antes perguntaria se ele aprovaria o nome de um postulante a uma vaga de emprego se este mentisse na entrevista para o cargo que postula. Tenho certeza que a resposta dele e assim como a de todas as pessoas corretas e coerentes seria que não. Então faria a ele perguntas identitárias. Pediria que ele declarasse seu nome, sexo ou gênero, raça ou coloração epitelial, religião, estado civil, grau de instrução e profissão.

Depois de ouvir suas respostas, perguntaria se ele se sentiria confortável para julgar uma causa que envolvesse alguém de quem ele é declaradamente um desafeto, um adversário, um inimigo.

E por fim, e antes de direcionar a ele as mesmas questões que foram direcionadas a Gonet, comentaria com ele que em uma entrevista, um repórter perguntou-lhe se ele era comunista e que a resposta dele àquela pergunta foi “sim, sou comunista, graças a Deus”, e que seria importante que todos soubessem se ele é realmente comunista e se em caso afirmativo, se ele acredita que suas convicções ideológicas vão permitir que ele possa julgar com total isenção causas que se contraponham aquilo que ele professa ideologicamente.

Disse ao meu interlocutor, que eu acreditava que mais que isso, seria completamente improdutivo fazer qualquer outro tipo de pergunta.

Por fim meu interlocutor me fez a pergunta fatal, me deu o golpe de misericórdia. Perguntou-me se eu fosse um dos senadores, se eu votaria contra ou a favor os indicados.

Eu dei uma sonora gargalhada e respondi sem pestanejar e justifiquei minha escolha: “Sim, eu votaria favorável às indicações, por motivos muito simples e claros. Os dois possuem os requisitos exigidos para ocuparem os referidos cargos, como manda a Constituição Federal, da qual sou um dos signatários, e penso que ambos sejam bem melhores que muitos que aqueles que poderiam ser indicados em seus lugares, além do que, no caso de Flávio, ele é melhor que aqueles que já ocupam uma cadeira em nossa Suprema Corte.

Desliguei o telefone e fui assistir a sabatina.