Temos ouvido há muito tempo que a base da democracia é a segurança jurídica. Ou seja, tem de haver um sistema de leis aprovadas de acordo com a Constituição de cada país. É a forma racional de as pessoas saberem que podem conviver seguras de que, se alguém ferir um direito seu, pode recorrer à Justiça que ela vai reparar essa violação, vai punir quem violou, vai obrigar o violador a fazer a coisa certa. Para isso é preciso que a Justiça funcione corretamente. Se não funcionar não se pode dizer que exista segurança jurídica e, portanto, não há democracia.

No caso do Brasil há instituições fora do Poder Judiciário que tem por finalidade defender a ordem jurídica. No artigo 127, da Constituição Federal, consta que o Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. E no artigo 133 está dito que o advogado é indispensável à administração da justiça. E a lei 8.906 de 1994, no artigo 44, diz que a Ordem dos Advogados do Brasil é um serviço público que tem por finalidade defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado democrático de direito, os direitos humanos, a justiça social, e pugnar pela boa aplicação das leis, pela rápida administração da justiça e pelo aperfeiçoamento da cultura e das instituições jurídicas.

A introdução é para destacar o que está acontecendo na escolha do novo desembargador para o Tribunal de Justiça do Maranhão, na vaga do Quinto Constitucional, na indicação da OAB do Maranhão. De acordo com as notícias que têm sido publicadas na mídia, é uma prova de que esse negócio de segurança jurídica é balela. Pelo menos para a OAB, tanto a do Maranhão, que não respeita as próprias regras, como a nacional, que tem aprovado essas irregularidades com sua omissão.

O Quinto Constitucional é uma regra da Constituição Federal que prevê, na composição dos tribunais, que um quinto de seus membros é integrado por advogados e promotores ou procurados de justiça, indicados pela OAB ou pelo Ministério Público, conforme o caso. Com a criação de sete vagas de desembargadores para o TJMA, uma será para indicação da OAB e outra para o Ministério Público.

Tudo começou quando a OAB-MA ultrapassou o prazo para deflagrar o processo da escolha. Recebeu a comunicação do TJ-MA para fazer a indicação mas ficou calada durante meses, até dezembro de 2022, quando aprovou uma resolução e depois um edital, que foram questionados em diversos itens após terem sido requeridos à OAB-MA informações e certidões sobre as sessões que aprovaram esses atos por diversos advogados e pelo Instituto dos Advogados do Maranhão. A OAB-MA nem respondeu. O objetivo era questionar cláusulas dos atos, que tratavam das normas para a escolha da lista sêxtupla da OAB-MA a ser enviada ao TJ-MA.

A falta de respeito da OAB-MA para com seus próprios filiados, não lhes respondendo aos requerimentos, é só a ponta de um iceberg de irregularidades nesse processo.

O Conselho da OAB-MA fez a lista sêxtupla, que foi encaminhada para o TJ-MA.

No TJ-MA o presidente recebeu dois requerimentos, reiterando irregularidades no processo.

O que se extrai desses fatos é que a Ordem não cumpriu o dever de casa e quer que o Tribunal siga o seu exemplo, de não respeitar o direito de petição e o contraditório. Na Ordem, como pode ser verificado nas datas dos eventos determinados pelo próprio presidente da Ordem, não havia prazo razoável para recurso. O presidente da OAB-MA demorou um ano para mandar a lista para o TJ e agora, num expediente que invade a autonomia e a independência de um Poder, quer dizer como deve agir o Judiciário.

Ao longo do processo não há notícia de que o Judiciário tenha interferido na escolha da lista pela OAB-MA, apesar das críticas feitas na sessão do dia 1º de março deste ano, na sessão do Órgão Especial do TJ-MA. Na mesma oportunidade o presidente da Associação dos Magistrados do Maranhão, Holídice Barros, manifestou-se sobre a escolha da lista pela OAB e o papel do desembargador.

Para muitos magistrados e advogados, os requerimentos dos advogados e do presidente da AMMA levantaram questões que o TJ já tinha em mira. Isso o presidente Paulo Velten já tinha dito no dia 1º de março, que o Tribunal de Justiça estaria atento ao processo de escolha. Na semana passada, na escolha das listas do TJ, enfatizou os requisitos constitucionais: notável saber jurídico, reputação ilibada e mais de dez anos de efetivo exercício de advocacia.

Se a OAB não soube fazer a sua parte, não respeita o ordenamento jurídico, nem as próprias normas, a sociedade espera que o TJ faça a sua parte corretamente, doa a quem doer. Ao fim e ao cabo, o novo desembargador vai julgar o cidadão e deve obedecer ao ordenamento jurídico. Caso contrário, a segurança jurídica continuará desrespeitada.

É aguardar e conferir.